OPERAÇÕES DE BARRAMENTOS | BIOSSEGURANÇA
CARLOS E. RIBEIRO JR. VIA INFOSÃOFRANCISCO | quarta-feira – 20 de maio de 2020
Monitoramento realizado em zona na região do alto sertão do Baixo São Francisco, confirma nova expansão de algas verdes sobre massa vegetal e de algas mortas em decomposição, comprometendo ainda mais o acesso à água pelas populações difusas e apontando a desastrosa e impositiva gestão do Velho Chico
Enquanto há água estocada em quantidade em Sobradinho (ver quadro abaixo) e Itaparica com volume dentro do previsto, permanece o inconcebível regime de penúria (imposta pelo sistema de gestão, docilmente dominado pelo setor elétrico) em nome da “segurança hídrica” deles, donos das águas, ao preço do precário, cada vez pior acesso à água de beber pelas populações difusas ao longo do Baixo e da detonação do que resta do rio São Francisco.
Em pleno outono são confirmadas, como já alertado, as ocorrências de novas camadas de algas verdes que estão se expandindo sobre uma massa espessa (densa e fibrosa) de vários centímetros de algas anteriores, mortas, e vegetação aquática, igualmente defunta. Biomassa em decomposição que cumpre agora, junto ao material orgânico vindo de efluentes lançados e dos excrementos, do enorme número de cabeças de gado solto nas margens, o papel de nutriente para as novas florações de algas e macrófitas.
Na linha de transição entre o espelho d’água e a parte secada do leito do rio, a situação é ainda mais macabra, pois é o foi destinado, pelos gestores a serviço dos donos da água, para as populações que não contam com sistemas de captação e tratamento do líquido para seu cotidiano. Com as impensáveis e insuportáveis operações moduladas, com variações de vazão ao longo do dia e ainda menos água nos finais de semana e feriados (de fato, qual a razão lógica para que a população do Baixo, nos períodos de finais de semana e feriados, tenha mais água disponível?) a faixa de transição (repetindo sempre, sobre o leito do rio secado) é irrigada e fertilizada pela matéria das algas, plantas provocando um novo ecossistema de vegetação exótica extremamente agressiva, que invade a beira da água.
A remoção do material, em suas frentes de moradias, é um trabalho pesado, constante e insano. Pois a reprodução dos organismos é acelerada, podendo ser contabilizada em horas, levando à exaustão daquelas e daqueles que ainda insistem em manter o beiço do rio minimamente adequado para um banho e captação de água para beber.
Neste derradeiro caso, um detalhe relacionado ao chegar até a água para beber: quem tem uma embarcação e se dispõe (já que em seguida há o transporte dos vasos cheios para as residências, cada dia mais distantes da água), o caminho é a coleta no meio do rio, onde a fraca correnteza não tem força suficiente para liquefazer a suspensão verdosa das algas. É a melhor água a ser captada, se assim as pessoas quiserem. Um detalhe sem criticidade, parafraseando palavra apreciada em relatórios de monitoramento do quadro.
Com a ocupação do leito secado por essa nova mata, e sem correnteza, há a fixação do substrato, de sedimentos e, gradativamente, o leito do rio vai perdendo largura a caminho do pior. Trata-se de um consciente processo (da parte dos operadores do sistema) que também detona, além da paisagem que é assegurada para as pessoas, o direito do convívio com o rio, suas águas, e de mobilidade.
A beira d’água, antes local exuberante, com suas prainhas de areias limpas, boas de se ficar, hoje são pântanos medonhos que, de forma a calhar, perfeitamente encaixada nos objetivos de controle absoluto, sem qualquer resistência, vão desligando as pessoas do pouco que ainda resta de vínculo com o rio São Francisco.
Em meio a tanta destruição, o silêncio e ausências generalizados, da sociedade, dos municípios, estados e União, indicam que conflitos formais muito provavelmente não existirão. Mortos já são antes de surgirem.
“MUITA ÁGUA PARA O BAIXO”
A partir do monitoramento realizado domingo, dia 17, foi possível elaborar uma rápida composição com gráficos aplicados sobre as imagens.
As leituras (variações das vazões sobre a régua) foram obtidas a partir de acompanhamento das variações das operações de Xingó e o cruzamento com os valores das vazões fornecidos (ANA e CHESF) e os níveis verificados. Podem ser encontradas pequenas diferenças, porém a escala está muito próxima da precisão desejada.
Na figura acima, a partir de uma foto no costão oeste da Reserva Mato da Onça, observamos a rocha embranquecia onde havia cobertura de algas que, expostas ao sol, se queimam. A cobertura desta variedade de algas ocorre em superfícies verticais com insolação, acompanhando as variações do nível da água (as vazões moduladas impostas pelo ONS – Operador Nacional do Sistema). Com a redução da vazão para 1.100 m³/s de média (o que significa vazões inferiores durante o período), os organismos vieram a morrer.
Ainda a observar (conforme já informado em matérias anteriores). Na região do alto sertão, as variações de nível da água correspondem, aproximadamente, para cada 190/200 mm a 100 m³/s (cem metros cúbicos por segundo).
Nesta outra figura (a imagem foi obtida no domingo, quando a vazão é reduzida abaixo do patamar praticado ao longo da semana), de forma mais ampla, podemos observar a quantidade de água perdida (hoje estocada em Sobradinho) para o sistema elétrico. De forma simplificada, foi realizada a marcação da linha d’água correspondente aos 2.000 m³/s anteriores a 2013 e o remanescente de zona ripária, já bem degradada (observando-se o avanço de vegetação em direção ao rio).
Há uma evidente perda de água para o setor elétrico (a constatação é óbvia ao observar o quadro esquemático das operações de ontem, dia 18, no inicio do artigo com volumes e vazões) que graças a uma resolução da ANA – Agência Nacional de Águas, a 2081/2017, obteve o seu modelo de operações idealizado há anos atrás. Com a resolução 2081/2017 a conta (em favor do setor elétrico) a ser feita é simples:
1- A vazão mínima estabelecida pelo Plano de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco é de 1.300 m³/s (hum mil e trezentos metros cúbicos por segundo).
2- A Resolução 2081/2017 estabelece como vazão mínima, 700 m³/s (setecentos metros cúbicos por segundo). Portanto, na manobra, um ganho de 600 m³/s.
3- Porém, e já havíamos apresentado que, com a emaranhada regra de operação parida na Resolução 2081, é praticamente ponto pacífico que não houve, não há e não haverá, intenção de retorno às vazões da ordem de 2.000 m³/s (média com variações). Portanto, somemos aos 600 m³/s acima, mais 700 m³/s. Temos portanto, todas as indicações para a instalação de um sistema de operações de barramentos que garante (de acordo com a situação a ser enquadrada pela Resolução) uma folga de 1.300 m³/s, supondo que, tendo a garantia legalizada dos 700 m³/s, haja retorno a este patamar.
Enquanto isso, a CHESF segue operando Xingó, com todos os entes do sistema de gestão, dos municípios, dos estados, da sociedade alagoana e sergipana, em profundo silêncio, com a Autorização Especial IBAMA 012/2017 (ver quadro abaixo) que permite a vazão mínima de 550 m³/s.
550 m³/s! VAZÃO MÍNIMA AUTORIZADA PELO IBAMA [ainda] EM VIGOR NO BAIXO SÃO FRANCISCO
Vamos insistir: o sistema elétrico, através da CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco, operadora dos principais barramentos na bacia, está funcionando – sem qualquer questionamento tanto pelos demais entes da gestão das águas mas também por órgãos que deveriam defender o patrimônio natural e direitos humanos difusos, além dos estados e municípios afetados e pela sociedade em geral – com a Autorização Especial 012 de 2017 do IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis que garante como vazão mínima 550 m³/s (quinhentos metros cúbicos por segundo), fato divulgado pelo InfoSãoFrancisco.
Imagem em destaque – A gestão de sucesso das águas do rio São Francisco. Foto: Carlos E. Ribeiro Jr. | Canoa de Tolda/InfoSãoFrancisco
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