Carlos E. Ribeiro Jr e Felipe Vieira – Via Rede InfoSãoFrancisco / domingo – 29 de dezembro de 2019

Naufrágio de um dos dois únicos exemplares da tradicional canoa de tolda deixa à mostra
a situação de precariedade de conservação,  e o real valor de insubstituíveis elementos do patrimônio naval brasileiro, todos, com raras exceções, em situação de extrema vulnerabilidade

Na madrugada de hoje, 29 de dezembro, a canoa de tolda Piranhas, de propriedade da Prefeitura Municipal de Piranhas, foi encontrada naufragada em seu porto, na cidade de Piranhas Velha.

A situação de hoje já teve um precedente, em 2017, quando a mesma embarcação, em outubro daquele ano, chegou ao naufrágio por abandono (veja reportagem – ainda que com informações não precisas – da Gazeta Web aqui).

A canoa Piranhas, na manhã de hoje. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco

Deitada sobre um dos costados, e apoiada pelos mastros, a canoa Piranhas se encontrava em situação comprometedora para sua estrutura, sendo que a prioridade, pela equipe de resgate mobilizada pela Prefeitura, foi a colocação da embarcação em posição normal, ainda dentro da água. A manobra foi feita, com sucesso, para que em seguida fosse tomado o procedimento para a retirada da água do casco permitindo que a canoa Piranhas voltasse a flutuar.

A canoa Piranhas, em outubro passado, no mesmo local. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco

Segundo Fábio Pedrinhas, Secretário Municipal de Cultura e de Turismo que se encontrava no local, a suspeita é de vandalismo, já que de acordo com informações (não confirmadas por investigações formais) teria havido movimentação suspeita nas proximidades da canoa pela madrugada.

Durante a operação para desvirar a canoa, foram encontradas duas chaves de fenda dentro da água próximo a canoa, o que aumentaria a suspeita. Porém, trata-se de uma mera hipótese, ainda sem pericia policial tanto nas ferramentas ou no casco da embarcação para confirmar.

Também será realizada avaliação dos danos causados pelo naufrágio, tanto com o objetivo de serem informações a complementarem o relatório do evento, mas também para a recuperação da embarcação histórica.

O problema da canoa Piranhas é da canoa Luzitânia, como de todo o Patrimônio Naval Brasileiro

O naufrágio da canoa Piranhas (o segundo conhecido, desde outubro de 2017), um bem histórico móvel, pertencente a um órgão público (a Prefeitura Municipal de Piranhas) mostra a vulnerabilidade de objetos similares, como a canoa Luzitânia (de propriedade da Sociedade Canoa de Tolda) e demais embarcações tradicionais brasileiras.

Embarcações tombadas pelo IPHAN – Galeria | IPHAN

A situação vale tanto as embarcações tombadas pelo IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional  (como o saveiro Sombra da Lua, na Bahia; a canoa de pranchão Liberdade, no Rio Grande do Sul e a canoa costeira Dinamar, no Maranhão) como os demais exemplares remanescentes, espalhados pelo Brasil e sem qualquer proteção formal, estes, que desaparecem rapidamente, junto com a memória de um dos mais originais patrimônios navais do mundo.

Seja qual for o resultado do inquérito a ser realizado sobre as verdadeiras causas e responsáveis pelo afundamento da Piranhas, o fato é que podemos entender que há um risco consistente quanto à conservação de tão importantes embarcações.

O tombamento da embarcação não garante, necessariamente, que sejam alocados recursos específicos pelo IPHAN para a conservação da mesma. Com verbas cada vez mais reduzida, e com perspectivas futuras nada positivas, a situação é preocupante. Quanto às demais embarcações, sem dispositivos legais de proteção e conservação, não seria alarmismo estabelecer que estão com seus dias contados, posto que são objetos cada vez mais sem uso prático.

ACOMPANHE AS MANOBRAS DO RESGATE DA CANOA PIRANHAS

Com auxílio de máquina, a primeira manobra consistiu em recolocar a canoa em posição normal. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco+

O mastro de popa foi apoiado com a cana de leme para facilitar a manobra. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco

As manobras prosseguem e a bomba de esgotamento já está pronta para uso. Foto | Aline Soares | Rede InfoSãoFrancisco

Como o local não é tão fundo, a operação foi menos complexa. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco

A canoa recupera sua posição normal. Foto | Aline Soares | Rede InfoSãoFrancisco

Lentamente, a canoa é encalhada próximo da beira para a manobra de esgotamento de água. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco

Como o local não é tão fundo, a operação foi menos complexa. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco

Gradativamente a canoa Piranhas é colocada a flutuar. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco

♦ A canoa Luzitânia é conservada através do Projeto Luzitânia, uma iniciativa permanente da Canoa de Tolda.

♦ As ações para o patrimônio naval no Baixo São Francisco ocorrem através do Projeto Embarcações do Baixo São Francisco, uma iniciativa permanente da Canoa de Tolda.

Imagem em destaque – A canoa Piranhas. Foto | Felipe Vieira | Rede InfoSãoFrancisco

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